Day-to-Day

[TCC] Circuito Fechado.

October 10, 2010

Esse TCC é, claramente, uma daquelas histórias que você lê, ou assiste, e a originalidade combinada com simplicidade é tanta que você pensa: “Porra! Eu queria/podia ter escrito isso!”. Já que não escrevi, e a produção é no melhor estilo de guerrilha, a maioria das cenas requer equipe pequena, então acabei ficando mais de fora do que de dentro, e até o momento só participei de uma diária, que tomarei como referência para todo o projeto.

Meu primeiro contato com Circuito Fechado foi no Profissão: Repórter, quando o Fattori comentou sobre a engenhosidade do roteiro, um filme todo pelo ponto de vista da câmera, ela como protagonista efetiva da história. Assim que chegou o email do Richard (roteirista e fotógrafo da parada), falando que eles estavam precisando de assistentes, me candidatei e pedi uma cópia do roteiro para saciar minha curiosidade.

O próximo parágrafo contém detalhes sobre o fim da trama. Se você não quer saber, pula!

Definitivamente, o Fattori não me enganava quando disse que era engenhoso. Circuito Fechado começa numa praça, onde uma equipe de TV roda uma reportagem. Durante as filmagens, a equipe é assaltada por dois homens armados, que matam o câmeraman levam a câmera embora. Desse ponto em diante, ela passa por um traficante no morro, policiais corruptos, um puteiro, um passeio real na Vinte e Cinco de Março, e por fim pára na vitrine de uma loja de contrabando, onde acaba sendo comprada por… exatamente, a mesma equipe de filmagem, mas isso só é revelado na última cena, no galpão de equipamentos, depois de filmar a campanha de um político também corrupto.

O detalhe mais importante sobre essa coisa toda: SEM CORTES! O filme todo é como se fosse um grande plano-seqüência, com seus cortes muito bem escondidos ao longo da trama, destinados a passarem despercebidos pelo espectador.

A diária que a gente participou, na Terça, foi justamente a da primeira seqüência, onde a câmera é roubada. A cena toda é uma coisa só, mas tem dois cortes escondidos que vou exemplificar aqui. E a idéia é parecer real. Mínimo de equipamentos, orçamento apertadíssimo e muuuuita criatividade para resolver todos os problemas.

Tá, retomando a cena. Começa com a câmera no tripé, operada pelo próprio Richard, num plano fechado da atriz, que vai falando seu texto e andando para frente. Conforme ela anda, a câmera vai abrindo o quadro com o zoom, revelando a praça ao redor. Ao fundo, percebemos uma moto que passa devagar, e um homem aponta em direção à equipe de filmagem. A moça erra o texto, o diretor repassa a fala dela e ela recomeça. O câmeraman (ator) limpa a lente e diz que vai fazer o take na mão. A câmera sai do tripé, e continua, mais uma vez do começo do texto da moça. Ouvimos gritos, a câmera vira para o lado, a moto está parada perto deles, e um cara ameaça a todos com uma pistola, anunciando o assalto. O câmeraman continua filmando, o bandido vai em sua direção, apontando a arma, chega bem perto e atira. “Filma agora, filho da puta!”. A câmera cai junto com seu operador, vemos o bandido se aproximando, a pegando pela alça – sem parar de filmar – e revelando o corpo, com um tiro na cabeça. No braço do ladrão, uma tatuagem de cobra que morde o rabo. Então, ele vai em direção à moto, mas câmera fica apontada para a equipe de filmagem que corre para tentar ajudar o câmeraman morto. A moto arranca com tudo, câmera apontada para trás, apontando para a rua.

A gente chegou na tal pracinha, aqui nos Jardins, umas 7h, começou a rodar umas 9h30, e só saiu ao meio dia. Primeiro, eram os cachorros. Um milhão de cachorros e seus “passeadores”, correndo alucinadamente pela praça, cagando em tudo, tentando mijar nos equipamentos e sendo duramente repreendidos por nós. Os equipamentos podem ser velhos e acabados, mas xixi de cachorro não agrega valor às coisas!

Depois dos cachorros, foi a ameaça de chuva, quando ficou tudo nublado e a equipe inteira lembrou que a previsão de tempo era de chuva. Mas no fim abriu o Sol de novo, e a gente conseguiu até uma iluminação decente. Ver a cena se desenrolando na realidade, com toda a equipe (a verdadeira e a falsa), e ver a cena pelo monitor que mostrava o olhar da câmera eram coisas totalmente diferentes. Assistindo no monitor, você tinha certeza de que o filme ia funcionar. Assistindo a realidade, você tinha certeza que o processo cinematográfico é muito mais criativo do que é possível imaginar.

Orquestravam-se, dois booms (aqueles microfones que ficam presos numa vara, pegando o som por cima), um verdadeiro e um falso, ambos inicialmente fora de quadro, o movimento da moto, coordenado por Vini, assistente de direção, que ficava dando sinais de “mais rápido”, “mais devagar”, “mais ênfase”, com os braços para a galera que estava a muitos metros de distância, passando na rua lá atrás. A movimentação da câmera, coordenada pelo Richard e com ajuda do Mosca, soando o mais natural possível, e as atuações de todos que apareciam quando o quadro se abre, revelando o assalto e a equipe falsa.

Caso você não tenha reparado, o primeiro corte é quando o câmeraman é baleado, que a câmera cai. Nesse movimento, tudo acaba ficando branco/azul, por causa do céu, e é tanta coisa passando na tela que dá pra cortar sem preocupação. Aí o Lucas (que interpretava o bandido armado), vem pela frente da lente e pega a câmera, no que ele vira para o morto que está no chão, Richard assume o controle novamente e o ator sai correndo para não aparecer em quadro. Richard entrega a camera pro Mosca, que já está a postos na moto, e corre para não aparecer também, Nicol (diretor) arranca com a moto, e o Mosca acaba jogando a visão da câmera para o asfalto, onde é o segundo ponto de corte, para uma rua mais movimentada.

Além de lidar com os “passeadores” de cachorros, Caio (produtor) também teve que conversar com a polícia, quando algumas pessoas que passavam pelo local não repararam que a moto e os assaltantes estavam junto com a equipe de filmagem, e chamaram uma viatura. Aí a situação toda foi explicada e o carro acabou ficando pelas redondezas, escondido. Depois desse momento, percebemos que era sempre possível achar alguém que se assustava quando o assalto era anunciado. A grande vencedora foi uma mocinha de verde, que se aproximava da praça, e ao ouvir os gritos e ver a moto e o camarada armado, saiu correndo loucamente pelo caminho por onde veio, tentando se esconder e se proteger ao mesmo tempo.

O mais engraçado de filmar essas seqüências é que, da mesma forma que a gente só conseguiu acertar quando já era meio dia, podia ter acertado na primeira, e todo mundo ter sido liberado às 10h da manhã, ou não ter acertado em momento algum. É um jeito um tanto imprevisível, e muito heróico, de se filmar! Imagino que as outras seqüências não fossem tão complicadas quanto essa, em termos de controlar muitas coisas ao mesmo tempo, coordenadas com o movimento da câmera, mas ainda assim é algo deveras difícil de fazer! O filme tinha quatro diárias nessa semana (na verdade, eram seis meias-diárias), e tem mais duas meias diárias na semana que vem. Acredito que vou participar de mais uma na próxima Sexta, e venho aqui contar pra vocês.

Esse é um dos projetos que mais quero ver prontos.

  • bianca October 27, 2010 at 12:50 pm

    amei seu blog é muito maneiro..engraçado