Day-to-Day

UP09 – Slow Shutter

October 5, 2013

Fotografia: um momento eternizado num piscar de olhos. Essa é uma definição comum. Mas, há muito além daí. O objetivo da coluna deste mês é sugerir justamente o contrário: como eternizar, numa única foto, um grande intervalo de tempo. Falaremos aqui da fotografia em baixa velocidade e suas características mui peculiares.

Um bom exemplo desse estilo fotográfico são imagens de rastros de estrelas, nas quais o que se vê são desenhos circulares concêntricos no céu noturno (algo inatingível para nossos olhos nus). Provavelmente você já viu fotos de paisagens onde a água parece macia, “sedosa”, enquanto o resto da imagem aparenta estar normal, ou, então, fotos de grandes ruas ou avenidas desertas em plena luz do dia –onde seria impossível bloquear o acesso de carros ou pedestres para uma fotografia.

Para entender como isso acontece, precisamos primeiro compreender como o filme ou sensor captura as imagens. Ambos são compostos de pequenos pontos sensíveis à luz – chips fotossensíveis no sensor digital, e grãos de sal de prata na película fotográfica – que são excitados de acordo com a intensidade luminosa que incide sobre eles. Se não há nenhuma luz, a imagem é completamente preta. Se não há luz suficiente – seja por fatores controláveis (ISO ou abertura) ou fatores externos (luz disponível) – a imagem fica subexposta, com áreas sem informação. Mas e se houver pequenas fontes de luz e essas fontes se moverem?

Em condições normais, onde o obturador fica aberto por frações de segundo, elas teriam seu movimento congelado, correto? E se prolongarmos esse tempo de ação do obturador? Digamos que, ao invés de abrir e fechar mais rápido que um piscar de olhos, ele fique aberto por vários segundos, minutos, ou mesmo horas, permitindo a passagem de luz pela lente até o sensor. O que acontece então?

Para responder, vamos incialmente investigar o caso dos rastros estelares. Tomemos o céu noturno como preto e as estrelas como pequenas fontes luminosas. O elemento chave a se levar em consideração é o que ocorre durante o tempo de exposição. Move-se a Terra – onde você está, com sua câmera! –, mas, para nossa percepção, o que se move é o Céu com suas estrelas. O sensor exposto por dois ou três segundos já consegue captar e nos mostrar o que nossos olhos não conseguiriam perceber: as estrelas ‘andando’ pelo céu.

Lentes grande angulares atingem os melhores resultados justamente por mostrarem uma ampla paisagem, imóvel durante longo tempo de exposição, combinada ao céu cheio de linhas desenhadas pela luz. O raciocínio é mais ou menos igual para as imagens de água “sedosa”: enquanto o rio corre veloz, as pedras, árvores e plantas que o cercam praticamente não se movem, ficando congeladas na imagem, mas a água em movimento vira um grande borrão macio e agradável aos olhos.

No exemplo de lugares muito movimentados que aparecem desertos em fotos, usa-se a desvantagem desse grande trânsito como uma vantagem na hora de fazer a exposição: o único elemento realmente estático na cena é o ambiente – a rua, postes, prédios e placas. Se você configura a câmera para deixar passar pouca luz pela lente – através da abertura ou de filtros – e define um intervalo longo de exposição, tudo que se move vai ser registrado praticamente invisível ou transparente, justamente por não ter luz suficiente para ativar os chips no sensor. Só o que está parado, durante o tempo de exposição, é que vai refletir luz suficiente para excitar os chips do sensor, ou grãos do filme, e ficar perfeitamente registrado na fotografia.

Importante ressaltar que também a câmera deve ficar completamente imóvel durante o tempo de captura. Um tripé de verdade, ou apoio equivalente, é fundamental para a produção de imagens desse tipo. Qualquer tremidinha, por menor que seja, vai borrar os elementos da cena que deveriam estar estáticos.

Caso resolva experimentar a fotografia em baixa velocidade, lembre-se de fazer testes de curta duração e gradualmente ouse aumentar o tempo de exposição a partir de seus resultados. Não é recomendável começar com grandes intervalos de tempo, pois há muitas variáveis em jogo e você precisará de tempo para aprender a ajustar cada uma delas.

Fotografia é usar a luz para contar histórias. Às vezes rápidas, como um piscar de olhos, às vezes longas, como mil e uma noites.


Coluna Ultrapassagem, Publicada originalmente na Revista OLD #23, em Julho/2013