Registro 01

REGISTRO 01, CAPÍTULO 01

John Matches sentava na frente de sua mesa de trabalho novamente. Dia após dia, durante um ano ele trabalhara na Organização de Pesquisas Avançadas sobre Biotecnologia, ou simplesmente OPAB, como era chamada por todos os funcionários.

Criada pouco antes da Segunda Guerra Mundial, por volta de 1938, tinha como objetivo desenvolver armas e proteções biológicas. No início, era apenas um pequeno laboratório na universidade de Massachussets, porém, com o passar dos anos e com o intenso desenvolvimento, a agência veio crescendo mais e mais, necessitando de mais espaço, pesquisadores e funcionários. Também aumentou o risco e importância dos experimentos. Por esses motivos a OPAB é oculta da vista da maioria da população e protegida pelo segundo maior sistema de segurança digital do mundo.

Ele fora desenvolvido ao longo dos anos 90 e vem apenas sofrendo modificações desde então. Seu criador, Doug “ColdWinter” Romanov, gênio da computação, fora contratado como “técnico vitalício” de seu sistema – uma obra prima que, infelizmente, nunca será reconhecida. A única barreira que supera a complexidade das proteções da OPAB é o próprio sistema de segurança da NSA – National Security Agency.

Com o crescimento da organização, ampliou-se também seu alcance, que agora se estende a todo e qualquer tipo de material e substância gerados organicamente. As pesquisas vão desde simples procedimentos acerca de organelas celulares até níveis de risco extremo, como o desenvolvimento de vírus e outras armas biológicas poderosas.

John obteve seu emprego na OPAB devido a um golpe de sorte enquanto estava na universidade: na data marcada para a entrega de resultados, um de seus colegas mais brilhantes adoecera, e pedira a ele para pegar seus resultados do curso; e então, lá estavam eles. Ternos pretos e óculos escuros; esperando-o sair do campus. Ao entrar no carro, fora interrogado sobre seus ideais e respondera a alguns testes simples de análise psicológica. Deixaram-no na porta de casa. Nunca comentou esse incidente com o colega.

Neste primeiro ano de trabalho na OPAB, John ganhou mais promoções do que muitos outros jamais ganhariam em toda a sua vida. Durante este ano ele realizara pesquisas acerca do desenvolvimento de bactérias parasitas tão influentes em seu hospedeiro que, após sua morte, assumiam o controle de seu corpo, exercendo as funções vitais e utilizando-o de acordo com sua vontade. O alto escalão da OPAB monitorava toda a pesquisa com um tom sombrio e duvidoso, mas nunca deixara de fornecer verbas a John.

Ultimamente ele vinha trabalhando no desenvolvimento de uma pequena colônia de formigas, que serviam de hospedeiras para suas bactérias. Ao entrar no complexo da OPAB, dirigia-se primeiro para a câmara em que a colônia ficava armazenada sob eterna quarentena, a fim de verificar quaisquer alterações de um dia para o outro e se havia algo diferindo do que fora previsto em sua pesquisa.

Depois da verificação, ele ruma para sua mesa, onde estava neste exato momento, escrevendo o relatório diário do experimento:

“21/05/2008 – Quarta-feira. Relatório – Bactéria Mattis Imortum”.

“Não ocorreram alterações perceptíveis a olho nu na colônia após dezessete dias de observação. Nas últimas vinte e quatro horas foram infectadas as sete Acromyrmex que receberam o soro protetor, permitindo que elas resistissem apenas um dia além das outras. Essas contaminações fazem com que todas as duzentas Acromyrmex agora estejam infectadas com a Mattis Imortum, sendo que o número inicial de Acromyrmex infectadas na criação de colônia era de treze. Em dez dias a bactéria já se disseminou entre todas as outras, incluindo a rainha, que contaminou todos os ovos que pôs na temporada de acasalamento, confirmando a suspeita de que a bactéria se aloja também no material genético e nos gametas dos hospedeiros”.

“Amanhã será testada a efetividade das Acromyrmex contaminadas numa disputa por um novo formigueiro contra…”.

Ao chegar neste ponto de seu relatório, a atenção de John é desviada pelo grito de um de seus colegas. Algo extremamente comum no cotidiano dos laboratórios da OPAB, uma vez que, diariamente, novas pesquisas eram concluídas com sucesso. Mas não desta vez. Ao voltar-se para seu relatório, a tela de seu computador está preta com um aviso vermelho piscando: ALERTA VERMELHO – EVACUAR ÁREA IMEDIATAMENTE.

O caos se instaura no laboratório instantaneamente. Todos corriam para as saídas de emergência, mas não John. Ele tinha que destruir as formigas contaminadas, portanto, rumava na direção contrária à de todos os seus colegas. A segurança de todo o planeta poderia estar em risco se qualquer coisa acontecesse àquelas bactérias, pois John não havia feito nenhum tipo de teoria acerca de seu funcionamento em seres humanos, exceto de que suas conseqüências pudessem ser as mesmas que nas formigas.

Se isso fosse verdade, elas se tornam extremamente perigosas, pois facilmente criariam um exército de corpos sem mente, cujo único objetivo é se alimentar do que quer que esteja em seu caminho. O cancelamento do experimento é imprescindível antes de deixar o complexo.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 02

Quando chegam à parte externa do prédio, os cientistas são recebidos por militares armados. A maioria dos soldados é de baixo escalão, usando a farda camuflada padrão, mas entre eles, podem ser vistos alguns agentes de elite, usando coletes e capacetes à prova de balas, e vestindo roupas de combate noturno. Há também alguns poucos oficiais, vestidos de verde, com dezenas de medalhas no peito. Podem ser vistos muitos jipes, caminhões camuflados e um helicóptero de combate rápido. O representante dos militares, aparentando ser o piloto do helicóptero se aproxima:

— Onde está Matches, John Matches?

No meio da confusão, ninguém prestara atenção em John. Ninguém sabia de sua localização nem de sua ida às escondidas na direção da Quarentena.

Ângela Nourish, pesquisadora da OPAB há pouco mais de cinco anos. Mulher de baixa estatura, bastante atraente, com longos cabelos negros, cuidadosamente penteados, corpo bem torneado e esbanjando juventude com seus vinte e seis anos. Seus olhos, de um verde intenso, era o que mais chamava atenção em Ângela. Nariz afilado, boca pequena e covinhas no sorriso completam seu rosto. Quase sempre de bom humor com seus colegas, e ao mesmo tempo bastante séria em relação a suas pesquisas, não é de se espantar sua fica de dar inveja na maioria dos outros cientistas. Mais de quinze pesquisas concluídas com sucesso e nem sequer um fracasso. Assim como John, fora recrutada assim que se formara no curso de Biotecnologia em Yale, e atualmente morava também na pequena vila de empregados da OPAB.

Sua primeira pesquisa envolvia uma variante do Ebolavirus denominada DFL 00913, altamente letal. Os estudos de Ângela comprovaram que, apesar de mortal, o vírus só oferecia risco se o contaminado sofresse uma exposição contínua ao DFL 00913. Isso retirava o vírus de uma grande lista de agentes biológicos perigosos em caso de ataques terroristas. A cura para ele: uma simples e barata vacina, já em fase de produção, que seria incluída no programa público de saúde.

Poucas semanas depois, num sábado, um grupo radical ameaça contaminar os reservatórios de água da cidade de Nova York com essa variante do vírus. Sua carta de condições diz:

“Nós somos o Killer Saturday. Temos conosco, diversas amostras de um vírus desconhecido e letal espalhadas pela cidade, em pontos estratégicos.”

“Vocês têm três dias para transferir US$ 1 bilhão para a conta número 8874619-258 nas Ilhas Cayman. Caso isso não seja feito, o vírus será liberado.”

Seguindo à risca a política do Estado de nunca negociar com terroristas, é feita uma grande investigação, em menos de vinte e quatro horas, para se descobrir qual seria o vírus, e quais são os riscos. Assim que o DFL 00913 é detectado no papel da carta e reconhecido como “baixo risco”, tudo que os federais fazem é pedir um adiantamento no lote de vacinas da cidade, e promover uma massiva campanha de vacinação.

Quando o vírus é liberado, no sábado seguinte, suas conseqüências não são sequer notadas, exceto por um breve surto de gripe em algumas regiões da cidade.
Atualmente Ângela dirigia, entre vários experimentos, um similar ao de Matches, e, portanto poderia ser considerada sua concorrente. Em seu currículo constava também um protótipo de gerador de luz solar, projeto não muito desenvolvido.

Contemplada com total confiança por parte do comando da organização, Ângela tinha a seu serviço os melhores cientistas do mundo, além de qualquer outro que desejasse por motivos pessoais.

Ela fora uma das últimas a deixar o laboratório, e lembrava-se de ter visto Matches indo em direção à Quarentena. Depois de alguns momentos meditando se seria seguro, ela se aproxima do piloto.

— Senhor, eu vi John indo na direção oposta à que tomávamos. Creio que ele esteja indo para a Quarentena. Há um experimento em curso que é muito importante para ele.

O piloto, imediatamente, chama um pequeno grupo de soldados e os manda em busca de John.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 03

John corre desabalado pelos corredores escuros do complexo totalmente deserto até chegar à área da Quarentena. Ao digitar sua senha porém, o dispositivo começa a piscar com a mensagem: ACESSO NEGADO – ALERTA VERMELHO – dirija-se ao Posto de Comando.

O complexo situado no meio do deserto era composto por diversos setores, separados por inúmeros corredores vigiados eternamente pela equipe de segurança. Luzes fortes faziam com que qualquer pessoa lá dentro perdesse a completa noção de tempo, em parte também pela ausência de janelas.

Cada cientista tinha seu código de acesso, que, a depender de seu posto na hierarquia, permitia acesso a setores mais importantes para obtenção de dados.

Correndo para o Posto de Comando, John ainda pode ver o alerta vermelho piscando em todos os monitores. Cinco minutos após o alerta ser emitido, todas as luzes do prédio foram apagadas, ativando-se as luzes de emergência, fluorescentes, que emitiam pouca luminosidade e projetavam longas sombras pelos corredores e salas. Os corredores abandonados e silenciosos criavam um ambiente sinistro e assustador ao redor de John.

Apesar de ter conhecimento da localização do posto de comando, John nunca de fato fora até lá, uma vez que não existia essa necessidade. Ele sempre mandava um técnico ir em seu lugar quando ocorria qualquer tipo de problema. Então, ao chegar, John não sabe o que fazer! A trava de segurança desta porta também estava ativada, mas, ao tentar seu código de seis dígitos, John ouve uma voz digital que diz:

— “Usuário Autorizado” – enquanto a porta metálica, com meio metro de espessura, se abria silenciosamente, deslizando para dentro da parede de concreto blindado.

A senha de John funcionara aqui, mas não na Quarentena. Por quê?

O posto de comando era uma sala pequena, mal iluminada, com paredes metálicas e grandes janelas espelhadas dando para os corredores, para que nenhum dos cientistas visse o que acontecia lá dentro, mas para que os seguranças observassem tudo que se passava em suas redondezas. Pesadas cadeiras e mesas de alumínio, realçadas por confortáveis almofadas contrastavam com estantes abarrotadas de caixas e equipamentos eletrônicos defeituosos. Dezenas de monitores ligados, cada um intitulado com uma diferente câmera de segurança da área do laboratório e da Quarentena, no momento não mostravam nenhuma imagem. Exceto a câmera 2, dos corredores LAB-2 e LAB-3, através dos quais John viera do laboratório.

As outras câmeras pareciam ter sido desligadas assim que o alerta foi dado, mas não havia nenhum sentido em aquela única estar ativada. Havia alguém ali, espiando-o enquanto ele corria pelo complexo deserto? Haviam muitos outros postos de comando separados a intervalos regulares por todos os prédios. Normalmente, alguns seguranças ficavam ali, observando e cuidando para que nenhum dos pesquisadores tivesse qualquer tipo de problema relacionado à parte técnica de sua área. Exatamente o que John estava tendo agora.

Como desativar a tranca na porta para entrar na Quarentena? Ele sabe que em algum lugar daquela sala há um teclado numérico que, com a combinação certa, pode destrancar todas as portas de seu setor. Procurando atenciosamente, sem prestar atenção no único monitor que exibe a câmera 2, John não percebe os três indivíduos fardados, usando capacetes e com pistolas em punho que se deslocam pelos corredores vazios.

Exaurido por sua busca desesperada e sem resultados, John passa para as estantes, não mais em busca do teclado numérico, e sim de qualquer objeto capaz de quebrar a tranca. Jogando as caixas ao chão e espalhando seu conteúdo, espalhando dispositivos eletrônicos imperfeitos para todos os lados, ele finalmente encontra o teclado, mas este está danificado; o que já não faz nenhuma diferença. Ao olhar para a estante, agora vazia, John encontra o que procurava. Seus olhos brilham e ele pensa – “Afinal! Um momento de sorte no dia de hoje!” enquanto pega o machado de incêndio que se encontrava atrás de uma das caixas e volta correndo em direção à sua colônia de formigas contaminadas.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 04

Do lado de fora do prédio, os cientistas, ainda assustados, começam a se perguntar o motivo do alerta. Sem se incomodarem, os militares continuam olhando para cima, como se apreciando o céu. Ao fazer o mesmo, um dos técnicos descobre o que lhes chama tanto a atenção: uma enorme mancha negra, que aumenta gradativamente de tamanho e cobre parte da luminosidade que chega até eles. Quando a claridade começara a atenuar-se é que os cientistas percebem a gravidade da situação em que se encontram, ao mesmo tempo em que percebem a causa do alerta.

Neste momento, os militares começam a se organizar, sem trocar uma palavra sequer com os cientistas e técnicos aterrorizados. Correndo de um lado para o outro, levando o equipamento de volta para os carros, motores começam a roncar, aumentando ainda mais a tensão.

Subitamente, os soldados começam a chamar os cientistas, em grupos de cinco pessoas, e procedem alocando-os nos carros, organizando-os de acordo com os setores em que trabalhavam. Assim que preenchidos, os carros partem a toda velocidade pelo deserto poeirento e cada vez menos iluminado.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 05

Voltando às pressas para o setor da Quarentena com o machado em mãos, John é surpreendido pelos três soldados, que apontam suas armas para ele. Tomado pelo pânico, John levanta o machado.

— Solte a arma senhor! Coloque suas mão sobre a cabeça, onde eu possa vê-las! – grita um dos soldados, apontando sua pistola para ele.

Forçado a obedecer, John relaxa seu braço, soltando o machado, que cai com estrépito, estilhaçando o frio chão de granito negro atrás de si. Os soldados se aproximam, sem tirar a mira de John.

Um deles chuta o machado para longe enquanto outro pergunta:

— Matches, John Matches, é o senhor?
— Sim, sou eu, John Matches – responde John – Quem são vocês?
— Nós temos ordens expressas de resgatá-lo senhor. Vamos. O helicóptero está esperando por você.
— Receio que antes de irmos eu tenha que terminar o que estava fazendo – diz John, pegando o machado novamente.
— Sinto muito senhor, mas não há mais tempo. Nós devemos sair daqui imediatamente! Você está em risco.
— Se estas criaturinhas escaparem, quem estará em risco será todo o planeta – e ruma na direção da quarentena já preparando o golpe com o machado.

John mal percorre três metros quando sente uma dor lancinante sobre o ombro esquerdo e tudo desaparece.

— Sinto muito senhor – diz o soldado que o atingiu – mas, como disse, temos ordens expressas de trazê-lo ao comandante.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 06

Retornando à parte externa do complexo laboratorial, os soldados, com facilidade carregam John inconsciente em direção ao helicóptero. Quase não há mais claridade. Os faróis dos poucos veículos que ainda se encontram ali são os únicos geradores de iluminação.

Cinqüenta pesquisadores não foram embarcados em seus respectivos veículos no momento em que John é colocado dentro do helicóptero; acompanhado pelo comandante-piloto Carl Hudson e seus soldados.

— Ele não quis vir senhor. Fomos forçados a neutralizá-lo por alguns momentos.
— Ótimo. O importante é que agora ele está a salvo. Partimos imediatamente.

Assim que os rotores do helicóptero começam a mover-se, o comandante transmite uma mensagem pelo rádio.

— A encomenda já está na nova caixa, vamos partir.

Os veículos que ainda se encontravam parados ligam seus motores. Mais cinco pesquisadores são chamados para partir no último caminhão de transporte. Ainda faltam quarenta e cinco pessoas serem postas a bordo, no entanto, ninguém parece enxergá-las.

Coincidentemente ou não, estes quarenta e cinco cientistas remanescentes são os menos privilegiados e com menos pesquisas importantes concluídas com sucesso.

Momentos antes de decolar, o helicóptero recebe mais um passageiro: a srta. Ângela Nourish, que entra aos tropeços, devido à escuridão quase total. Carl decola com habilidade, deixando para trás rapidamente o ruído dos outros veículos e os gritos desesperados dos pesquisadores abandonados covardemente para uma rocha colossal que cai dos céus.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 07

Alguns minutos depois, John acorda. Ele está deitado numa cama improvisada, em um pequeno aposento com paredes de concreto reforçado. Ao olhar para cima, seus olhos se encontram com os olhos castanhos reluzentes de Ângela, que, apesar do cansaço aparente, o observava enquanto ele dormia.

Carl e seus soldados estão no canto oposto do quarto, assistindo algo na televisão, que é a única fonte de luz do aposento, emitindo um brilho azul escuro. As imagens não são transmitidas continuamente, como em um filme ou programa, mas sim em forma de fotos seqüenciadas.

Ao se aproximar para ver do que se trata, John fica aterrorizado com o que a sucessão de imagens: um asteróide gigantesco, neste momento, entrando na ionosfera. O bólido é muito maior do que qualquer outro previamente considerado em projeções; com aproximadamente doze quilômetros de diâmetro – maior do que o asteróide que varreu os dinossauros da face de nosso planeta. Seu impacto produzirá um choque equivalente ao de uma explosão de setenta milhões de megatons, ou o mesmo que um bilhão de vezes a explosão provocada pela bomba Little Boy, lançada sobre a cidade de Hiroshima, no fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945.

As fotos vêm diretamente da estação orbital ISS, que gira ao redor do planeta. No canto da tela, há uma contagem regressiva. Ao perguntar o que os números significam Ângela lhe diz que é o tempo de vida que a estação ainda tem, antes que a gravidade do meteoro a atraia para o choque fatal. Dentro da estação existem três astronautas de nacionalidades diferentes. Em outro canal, são mostradas imagens em que eles se despedem, emocionadamente, chorando e acenando, inconformados com a infeliz surpresa que o destino lhes arranjou: serem as primeiras vítimas do asteróide.

Quando percebem que John está acordado, todos se levantam e Carl se aproxima.

— Sinto muito pelo ocorrido senhor Matches, mas nós não tínhamos outra opção. O senhor era nossa única prioridade – John fica paralisado enquanto Carl continua – O meteoro irá atingir a OPAB dentro de instantes. Fazem exatamente trinta e dois minutos que saímos de lá. O planeta será coberto por uma nuvem de poeira durante muitos anos até que retorne à sua condição normal. Nossa missão era resgatar o senhor e trazê-lo para este abrigo subterrâneo.

— As bactérias! – berra John – seus homens não me deixaram destruí-las! Assim que o asteróide atingir o complexo, elas se espalharão com a nuvem de poeira, por todo o planeta! Exatamente o que eu tentava evitar até que… – o brilho se apaga dos olhos do cientista. Ele aparenta estar tentando lembrar-se do que aconteceu em seguida, mas tudo que ele consegue se lembrar é da dor.

Assustado com essa lembrança repentina, John toca seu ombro, para ver se não está quebrado. Imediatamente um dos soldados replica:

— Sinto muito senhor. O golpe deslocou sua omoplata, mas no caminho para cá nós já a colocamos de volta. A área ficará sensível e um pouco dolorida por alguns dias, mas estará de volta ao normal em no máximo uma semana.

Assistindo atônitos à seqüência de imagens exibidas pela TV até o momento da destruição da ISS, ninguém sequer imaginava o que viria acontecer a partir deste momento.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 08

E assim começou a Grande Contaminação. Depois de 12 minutos, 28 segundos e 97 centésimos após a destruição da ISS, a Terra é atingida pelo asteróide (058284), ou Huge One, como fora apelidado pelos leigos. Exatamente como John previra, a nuvem de poeira formada no impacto sobre a OPAB espalhou a Mattis Imortum por todo o globo, assumindo o controle do corpo de todos aqueles que morreram devido à catástrofe. O choque fora tão violento que desviara a Terra sensivelmente de seu curso natural e atrasado sua rotação. Desde então, as noites passaram a ser mais longas e frias, enquanto os dias se tornavam cada vez mais quentes, secos e curtos. Todos os rios secaram com o calor gerado no impacto, e áreas menos profundas do próprio oceano também foram evaporadas. Essa água é agregada à única nuvem do planeta. Extremamente densa, porém ainda capaz de flutuar; sua chuva rara é tão poluída que pode ser considerada pior que aquelas que caiam após um bombardeio nuclear, além de conter a maior concentração de bactérias por metro cúbico do planeta.

REGISTRO 01, CAPÍTULO 09

Ano de 2013. Cinco anos após a catástrofe. A população sobrevivente começa a sair de seus abrigos, espalhados por todo o globo, em busca de água e comida. Não foram muitos os sobreviventes; menos de um milésimo da população mundial, de sete bilhões de habitantes, conseguiu sobreviver.

Sem produção alguma durante esses cinco anos, a escassez de alimentos é desesperadora. Mas não há só a fome. Apenas seis pessoas no planeta sabiam da existência dos “seres imortais”, como foram chamados originalmente. Afinal, sobreviveram durante cinco anos sem luz solar, alimento, ar fresco, ou qualquer ambiente que criasse condições à vida. A maior parte dos organismos vivos foi totalmente extinta, outros foram completamente modificados, perdendo quaisquer semelhanças com seus antecessores.

Adaptando seu funcionamento vital, a Mattis Imortum fez com que poucas espécies continuassem “vivas”, se degenerando lenta e progressivamente. De forma inexplicável, os “mortos vivos”, como passaram a ser chamados, nome inspirado em antigos contos e filmes de terror ainda conseguem respirar o ar contaminado e comer qualquer tipo de material orgânico, além de conseguirem agir de forma conjunta.

FIM DO REGISTRO 01.

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